Carta às/aos estudantes

27/08/2020 12:54

CARTA ÀS/AOS ESTUDANTES

Olá pessoal!

Tomei a liberdade de escrever esta carta porque imagino que muita/os de vocês devem estar cheia/os de dúvidas sobre a continuidade do semestre 2020-1 de forma não presencial. Ontem começaram as matrículas on-line e mesmo que tenhamos feito um grande esforço para deixar tudo pronto, sei que teremos muitas reclamações de estudantes e professores por algumas falhas, pelas quais, em nome de toda/os da Coordenadoria, peço desculpas, mas que são decorrentes de causas que não temos total domínio.

Por mais que seja injusto que estudantes indígenas e quilombolas continuem sendo os mais prejudicados ad eternum, bem como estudantes com maior vulnerabilidade social, a “paralisação” da Universidade, alardeada falsamente por parte da imprensa e aceita por grande parte da sociedade que nos rodeia, além do controle rígido de normas impostas pela Federação, representada na Universidade pela Procuradoria Federal, fomos obrigados, em pouco tempo, a adaptarmo-nos a uma nova realidade, que é o ensino não-presencial emergencial.

A adaptação a esta nova forma de ensino/aprendizado foi um processo que durou meses e necessitou de centenas de reuniões de colegiados de departamentos, colegiados de cursos, NDEs, Câmara de Graduação, Câmara de Pós-graduação, Câmara de Pesquisa, Câmara de  Extensão,  Centros de Ensino e do Conselho Universitário. Cabe lembrar que em todas elas havia representação discente.  Todos os interesses destas diferentes instâncias representativas foram confrontados, disputados e votados em reuniões colegiadas, e o vetor resultante de tudo isto  foi a edição da Res.140/2020/CUn.  Aconselho a quem ainda não a viu que leia  pelo menos o seu Capítulo III, que trata do ensino de graduação.

A partir da publicação da resolução 140, começamos o processo de adaptação das disciplinas nos nossos cursos presenciais de Ciências Biológicas. Depois de reuniões conjuntas e individuais com NDE e Colegiado de Curso, foram estabelecidas  várias regras relacionadas ao planejamento de disciplinas e também à forma e ao conteúdo de seus respectivos planos de ensino, regras que foram acatadas pela maciça maioria dos professores.

Toda disciplina que está sendo ofertada desta forma adaptada  é resultado de um grande esforço feito pela maioria de professoras e professores, que em pouquíssimo tempo, tiveram que se familiarizar com termos novos, como nomes de plataformas online, podcasts, webconferências, lives,  síncrono/assíncrono e, mais que isso, aprender a lidar com todas estas novas tecnologias. Peço que tenham muita paciência conosco, pois certamente falhas ocorrerão.

Sabemos que esta forma de ensino poderá trazer prejuízos à formação de um biólogo educador, que é a meta na formação de vocês aqui dentro, principalmente no que se refere aos conteúdos abordados em atividades que antes tinham caráter prático.  No entanto, gostaria que refletissem sobre o fato de que, mais do que nunca, as disciplinas estão sendo “ofertadas” e não impostas. A resolução 140 e as regras impostas pelo NDE e Colegiado permitem que vocês cancelem a matrícula em disciplinas em qualquer momento do semestre, que não tenham atividades avaliativas síncronas, que tenham a frequência aferida em várias atividades e não somente em momentos síncronos, que fiquem com carga horária abaixo da mínima, e uma série de outras possibilidades que não existiam anteriormente.

Com certeza, para muita/os estudantes, não deixa de ser  uma oportunidade  para adiantar seus percursos e poder focar no que mais lhes interessa. Para outros, que estavam ansiosos para começar uma disciplina ou um estágio  há muito esperados, temo que esta nova forma os decepcionem.  Sempre há dois lados, em qualquer situação e, inevitavelmente, teremos que arcar com as consequências não só dos nossos atos, mas também de nossas omissões.

Nós, professores dos Cursos de Ciências Biológicas arcaremos com as consequências de nossos atos. Quero deixar aqui o testemunho de que  presenciei um enorme esforço por parte de  praticamente toda/os a/os docentes e servidora/es técnica/os em educação e, na grande maioria dos casos, não foi pelas imposições da Res.140, nem da Procuradoria Federal,  mas pela vontade de continuar cumprindo suas obrigações e pelo amor pela docência. Testemunhei professores com problemas de saúde se debruçando sobre o planejamento de seus planos, e debruçando-se literalmente, pois fizeram isso em suas camas, já que entenderam a necessidade  de darem do seu melhor a vocês estudantes, em meio a maior crise humanitária que já presenciamos.

Há rumores de boicote e isto muito me preocupou. Nada contra o direito de promover discussões sobre esta maneira nova de ensino/aprendizado, desafiadora para discentes e docentes, e que, queiram ou não, seguirá assim até que a pandemia seja controlada e, como sabem, sobre isso não há perspectivas otimistas.

A promoção de boicote pelas mídias sociais me parece demasiada afinação com um modo de ação constantemente criticado, até pelos que o promovem. Do meu ponto de vista é pueril e inconsequente. É necessário neste momento ter a compreensão do mundo real e de respeitar todo o esforço de seus professores, que estão de fato se sacrificando para fazer o melhor possível, tentando evitar que esta Universidade não feche à espera de algo imprevisível*.

Na minha visão, que obviamente não é de alguém que ainda está na graduação, isto é outra forma de negacionismo. Enquanto temos um governo que finge não entender a matemática das queimadas e da pandemia, alguns fingem não entender a matemática e a física de nossos laboratórios de ensino, de nossas horas aula, da grade de horários e de nossa estrutura administrativa*.

Tenho confiança de que a maioria de vocês terá  maturidade suficiente para avaliar a própria situação tranquilamente, julgando com sua próprias consciências o que é o melhor a fazer neste semestre e não simplesmente seguir a boiada dos “sempre contra”.

Aos indecisos do que fazer neste semestre,  sugiro que compartilhem suas dúvidas com colegas mais experientes, principalmente com aqueles que já provaram seu amor pelos estudos, com professores com os quais tenham mais afinidade e confiança e, obviamente, com seus pais, parentes queridos e pessoas que te querem bem.

Seja qual for a decisão de cada um/a, que seja bem pensada e que seja respeitada!

Prof. Carlos Zanetti

Coordenador dos Cursos presenciais de Ciências Biológicas da UFSC

 

*nestes parágrafos alguns trechos foram retirados ipsis litteris de troca de mensagens com o prof. André de Avila Ramos, que me autorizou o uso aqui nesta carta.